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Foto do escritorBeija-Flor Editorial

Desastres naturais e contratos de locação: um breve guia para locatários.


Por Glaucia Torres



Com sua vasta diversidade geográfica, o Brasil está sujeito a eventos climáticos que podem afetar significativamente a população. Um exemplo atual é o estado do Rio Grande do Sul, que está lidando com a maior catástrofe natural já registrada em sua história, desencadeada por chuvas intensas que ocasionaram deslizamentos de terra e enchentes devastadoras.


Em situações como essa, é fundamental que os locatários estejam plenamente informados sobre seus direitos para enfrentarem a crise com mais segurança e estabilidade. O Código Civil (Lei n. 10.406/2002) e a Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/91) são as legislações pertinentes, que regulamentam as relações locatícias, estabelecendo direitos e deveres entre as partes envolvidas nos contratos de locação.


Sob o contexto dessas leis, os locatários só devem responder pelos danos que tenham dado causa. Como eventos naturais são considerados casos fortuitos, que não geram responsabilização ou direito de indenização, aplica-se ao inquilino a excludente de responsabilidade pelas avarias no imóvel (art. 393, § único, CC).


Em termos práticos, imaginemos um cenário em que uma casa alugada foi danificada por enchentes, tornando-se parcialmente inabitável. Nesta circunstância, se o prazo para conclusão dos reparos exceder 10 dias, o locatário poderá solicitar uma redução proporcional do aluguel, considerando a extensão dos danos e o seu impacto na utilização do bem (art. 567, CC, c/c art. 26, LI).


Essa previsão decorre da aplicação do princípio da equidade e da proteção ao locatário em situações que afetam diretamente seu direito de uso e gozo do imóvel. Quando uma casa é danificada a ponto de se tornar parcialmente inabitável, fica comprometida a capacidade de usufruir plenamente o imóvel pelo qual se está pagando o aluguel.


Como é do locador a responsabilidade de manter as condições de habitabilidade do imóvel, o dever sobre a reparação destes danos recairá sobre ele, assim como suas despesas extraordinárias, exceto se o contrato de locação prever o contrário. Isso porque, pelo princípio da autonomia da vontade, é possível que as partes estabeleçam livremente os termos contratuais, conferindo-lhes validade plena, desde que não contrariem a lei (art. 393, CC, c/c art. 565, I, CC, c/c art. 22, X, LI).


Também devemos considerar a situação em que o imóvel se torna completamente inabitável ou o prazo para seu reparo seja superior a 30 dias. Em tais circunstâncias, o locatário poderá rescindir o contrato sem nenhuma penalidade, embora o que se veja na prática seja a composição amigável entre as partes, com soluções que atendam aos interesses de todos os envolvidos (art. 567, CC).


Nesses casos, é aceitável que o inquilino realize a obra e receba desconto no aluguel dos meses subsequentes. O locador também poderá reduzir temporariamente o valor do aluguel ou isentar o locatário de pagamentos durante o período de recuperação do imóvel. No entanto, para garantir a aplicação desses direitos, é essencial que o locatário informe o locador sobre a necessidade de manutenção, sob pena de ser responsabilizado pelos danos não comunicados (art. 23, IV, LI).


Essas soluções visam garantir o bem-estar e a segurança de quem aluga um imóvel, assegurando que o inquilino não seja mantido em condições precárias ou insalubres, além de promoverem a equidade nas relações locatícias, evitando litígios desnecessários, com alternativas justas para ambas as partes, já que o proprietário é igualmente vítima.


Apesar de não conseguirmos prever e evitar desastres naturais, uma medida essencial para mitigação dos seus impactos é a adoção de uma cláusula contratual que vincule a locação a um seguro residencial, com cobertura para eventos fortuitos. Esse seguro, que geralmente possui um baixo custo, oferece proteção significativa em casos de danos, pois a seguradora assume as despesas necessárias de reparação ou reconstrução do imóvel afetado, seu mobiliário e até objetos pessoais danificados durante o evento catastrófico.


Essa é uma alternativa que não apenas protege os interesses do locador, ao preservar o seu patrimônio, mas também traz vantagens substanciais para o locatário, proporcionando-lhe segurança adicional e reduzindo potenciais encargos financeiros em períodos de crise.


Ao refletirmos sobre as experiências das comunidades gaúchas, torna-se evidente o impacto negativo do desconhecimento das leis, que leva a situações de desamparo e desigualdade. É essencial compreender que o conhecimento jurídico, aliado à adoção de medidas preventivas, não apenas garante os direitos das partes envolvidas, mas também um ambiente de segurança e solidariedade em meio à adversidade.


Quando uma comunidade está bem informada e preparada, sua reconstrução após eventos catastróficos torna-se mais eficaz e, consequentemente, menos dolorosa. Essa reflexão também ressalta a importância da cooperação ativa entre diferentes setores da sociedade, incluindo autoridades locais, organizações não governamentais e cidadãos comuns, no intuito de facilitar uma resposta ágil e coordenada, minimizando o sofrimento humano e promovendo uma recuperação mais sustentável. 


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