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Foto do escritorBeija-Flor Editorial

ÁGUAS DE OUTONO: ENCHENTE DE 2024 NO RIO GRANDE DO SUL




Maria José de Melo

 

Cadê a flor que tava aqui? Poluição comeu

O peixe que é do mar? Poluição comeu

O verde onde é que está? Poluição comeu

Nem o Chico Mendes sobreviveu

Xote Ecológico – Luiz Gonzaga. Compositores: Luiz Gonzaga Do Nascimento, Aguinaldo Batista De Assis.

 

PARTE II – AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS


As mudanças climáticas são alterações que provocam, a longo prazo, mudanças nos padrões e nas características do clima e da temperatura do planeta Terra. Isso ocorre quando essas mudanças apresentam alternâncias no radar meteorológico, possibilitando medir os níveis de intensidade, localização, movimento e posição futura para um determinado local. Essas mudanças são registradas, observadas e analisadas, durante um período de tempo, inclusive, longo.


Elas podem ser causadas por processos naturais, tal como ocorreu no período glacial, marcado por temperaturas mais frias e avanços das geleiras, e nos períodos interglaciais, caracterizados por períodos de clima mais quentes. No entanto, essas mudanças também podem ocorrer pela ação do homem, na qual o marcador mais expressivo é o século XVIII.


Com base nesta perspectiva, as atividades humanas têm sido a principal causa das mudanças climáticas, principalmente em virtude da queima de combustíveis fósseis (como carvão, petróleo e gás), os quais produzem gases que retêm o calor. Além destas ações, também há o aumento do desmatamento e das queimadas e as alterações nos recursos hídricos, devido à poluição, aos aterros ou à mudança drástica no curso d’água.


Sem dúvidas, são vários os fatores (naturais ou humanos) que determinam a existência do fenômeno mudanças climáticas, alteram diretamente as dinâmicas do ecossistema global, e resultam nos desequilíbrios ambientais atuais. As consequências desses processos afetam as vidas humana, animal e vegetal. Cabe pontuar que, de acordo com o relatório feito em 2021 pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), órgão das Nações Unidas responsável por produzir informações científicas sobre as mudanças climáticas, o principal fator responsável pelo aumento da temperatura do planeta – das mudanças climáticas – é o ser humano, especialmente a partir da Revolução Industrial, e tem intensificado exponencialmente os impactos para qualquer ser vivo na terra, nos últimos 50 anos.


É a dinâmica natural da terra ou foram as riquezas dos milionários que criaram os refugiados do fenômeno “mudanças climáticas”? 

Inegavelmente, a dinâmica do planeta Terra é movimento vivo, com diversas alterações há milhões de anos; ademais, a atuação humana potencializa as mudanças climáticas em curto espaço de tempo. Já deu para perceber o quanto a destruição está sem freios, próxima do próprio movimento do capital. Não podemos esquecer, portanto, do marcador dessa alteração: a Revolução Industrial trouxe progresso e mudanças significativas para as relações humanas, mas, contraditoriamente, também provocou desigualdades, fome e miséria, de forma global. O modo de produção capitalista, com pouco mais de sete séculos de existência, tem um poder de destruição avassalador, sua base destrutiva da mão de obra do homem, além da exploração de todos os recursos naturais, vegetais e animais. 

Parece que fechamos os nossos olhos para a realidade na nossa frente!

Quem é mais vulnerável às mudanças climáticas?

A vulnerabilidade para uma população ou indivíduo pode ser diminuída ou aumentada, levando-se em consideração classe social, renda média anual, raça e gênero. De acordo com o Observatório do Clima (2022), estima-se que atualmente entre 3,3 bilhões e 3,6 bilhões de pessoas vivam em locais ou contextos altamente vulneráveis à mudança de clima*. São locais tais como as margens de rios e lagoas, as escarpas de morros, as regiões mais secas, semiáridas ou desérticas, assim como os locais próximos de geleiras. Ou seja, os efeitos colaterais severos chegam para a população vulnerável, pois, suas condições de moradias, principalmente, as colocam em risco. Essa população, por exemplo, que moram nas margens dos rios não tem a quem recorrer. O pouco que conseguem com muito trabalho é levado pela cheia de tempos em tempos. Portanto, são elas as mais vulneráveis às mudanças climáticas. A conta chega para o lado mais “fraco”, entrando pela porta de forma avassaladora e sem pedir licença.

O Estado e o papel dos órgãos ambientais

As mudanças climáticas são inconvenientes, chegam sem avisar. Sendo um problema e encontram pelo caminho diversos outros problemas (em razão da delimitação do espaço que nos cabe, não será possível explicar cada um deles aqui). No entanto, devemos fazer um alerta para a responsabilização sobre o que houve no Rio Grande do Sul e em diversas cidades brasileiras nos últimos anos quanto às enchentes. Sim, é possível planejar, preparar, usar técnicas de engenharia e estatísticas diversas para projetar as cidades e torná-las mais seguras para a população que vive nelas. Quando analisamos, de maneira geral, as cidades brasileiras, identificamos que elas ainda possuem estruturas parecidas com aquelas que atendiam às demandas do século XIX, enquanto as mudanças climáticas estão no século XXI. O cenário mudou, embora a projeção de mitigação seja um tanto quanto ultrapassada e deficiente para ser refúgio nas horas de agonia quando a chuva chega de forma avassaladora. 


O processo de ocupação das terras nas margens dos rios brasileiros aconteceu de forma imediatista, como forma de sobrevivência da população ou como movimento da expansão da especulação imobiliária. Como a população que ocupou esses espaços poderiam imaginar que algum evento climático pudesse ocorrer com uma dinâmica volátil? Nos últimos 24 anos, houve mudanças muito repentinas, no clima e nas temperaturas do planeta terra, mas quando o fenômeno das enchentes acontece, as cidades, ora ainda estruturadas com bases projetadas pelas estatísticas do passado, não têm recursos e nem planejamento para acolher e proteger as pessoas.


Nas últimas décadas, tem existido um descaso profundo por parte do Estado brasileiro (na representação dos governos federal, estaduais ou municipais), em relação às políticas de saneamento básico e aos sistemas de drenagem. Mas quando foi que respeitaram as leis ambientais?! A economia sempre passou por cima de qualquer ação voltada ao social. Atualmente, além desses apagões de políticas públicas de saneamento básico, tem ocorrido, desenfreadamente, o desmonte de órgãos voltados para a questão ambiental ou mesmo a desestruturação deles. Isso pode ser visualizado nos poucos recursos destinados à Defesa Civil, principal órgão responsável por acolher a população em períodos de catástrofe, especialmente nos recursos dirigidos às medidas protetivas.

Segue um depoimento escrito por Eduarda Rocha, uma escritora gaúcha, de Porto Alegre, a respeito dos estragos provocados pelas enchentes no Rio Grande do Sul, mais especificamente, na referida cidade: “A falta de investimento é o maior culpado nessa história. A cidade de Porto Alegre tem esse nome por ser um Porto, grande parte da cidade (que agora está alagada) faz parte do Guaíba. Parte do lago foi aterrando. Surgiu várias cidades “coladas” em um rio tão grande, o correto era tomar precauções. O Muro da Mauá, aguenta apenas 3 metros de água, chegamos a 5,35 metros. A Bomba de água do menino Deus e Cidade Baixa estragou, então, alagou 2 bairros. Diques transbordaram. Não é apenas (embora seja a principal causa) as mudanças climáticas. Em 1941 teve uma grande enchente pouco menor que esta, se isso já aconteceu, porque não tomaram precauções maiores? Nossas defesas estatais são ridículas! Conforme apontado por alguns veículos de comunicação, Sebastião Melo, prefeito de Porto Alegre pelo MDB, não colocou um real no fundo de prevenção as catástrofes climáticas, apesar de Porto Alegre ser uma cidade portuária. Milhões de reais em verba foram designados para serem investidos neste campo, mas não foi investido um real. Os governantes querem privatizar o Departamento Municipal de Água e Esgoto de Porto Alegre (DMAE) no entanto, não contrataram funcionários suficientes. Desmonte de estatal, falta de verba e agressão à natureza: um cálculo fácil para o desastre! Mas os principais responsáveis são os governantes. Houve verba, por que não cuidaram? Evitaram mais proteções e justificaram que o oposto afetaria a estética da cidade! Revoltante! Agrediram uma estatal de água privatizando-a; não havia verba guardada para a calamidade. Enfim, revoltada! Literalmente, é um desastre político. Não podemos culpar somente o Aquecimento Global, era uma tragédia programada. Em 1941, o Guaíba, chegou a 5 metros de água (ou perto disso), não era o Aquecimento Global, era a Geografia das cidades que não se encontrava favorável. Desde então, sabiam que podia acontecer. Foi criminoso haver mais de 400 milhões de reais em verba e o prefeito não colocar um real para salvar o povo dos efeitos climáticos. Isso foi criminoso, só não estamos debatendo muito no momento porque é só desgraça agora, mas espero que quando a água baixar, o povo se revolte mais ainda. Não foi um acaso, uma má sorte pelo aquecimento global apenas. Foi algo feito por políticos que embolsaram dinheiro público, além de desmonte de estatal para vender a preço de banana”.

Portanto, enquanto o governo silencia, se abstém de responsabilidades, negligencia a população, o povo sofre com problemas que são evidentes há décadas, tais como tragédias e farsas anunciadas que se repetem a cada ano. Quando pontuo a ciência explica o fenômeno dos eventos climáticos como as secas e as cheias partindo de duas explicações: a humana e a natural. Nós não estamos na era primitiva, estamos em uma sociedade contemporânea, era da tecnologia e da informação. Cadê a riqueza de nossa geração?!


Referências

CANÇADO, Maria Luiza Naves; MATTEUCCI, Mayra Portela Silva; SILVA, Fátima Maria Moraes. Afinal, o que são as mudanças climáticas? Disponível em:  <https://www.unicef.org/brazil/historias/afinal-o-que-sao-mudancas-climaticas>. Acesso em: 12 de set. de 2024.

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